sábado, 20 de outubro de 2007

Revista: Onda Jovem Tema: Meio Ambiente


Mestres de ação: Iniciativas que deram certo

Educação Ambiental


Conheça os esforços de três educadoras para conscientizar os jovens sobre a preservação dos ambientes humanos e naturais. A professora Regina Viegas (foto) orientou seu trabalho de cidadania ambiental a partir de pesquisa com os alunos
Yuri Vasconcelos
A paulistana Nícia Wendel de Magalhães, de 75 anos, a maranhense Luiza Pereira da Silva, de 35 anos, nascida no pequeno município de Fortuna, e a carioca Regina Viegas, de 38 anos, são três brasileiras que dividem uma mesma vocação: a educação ambiental. Elas nunca estiveram em contato, mas suas trajetórias profissionais têm muito em comum. As três são educadoras e, cada uma a seu modo, se dedicam a iniciativas que ajudam a melhorar o nível do ensino brasileiro e a conscientizar os jovens sobre a importância de se respeitarem e preservarem os ambientes humanos e naturais.
Formada nos anos 1950 em História Natural pela Universidade de São Paulo (USP), Nícia é uma das pioneiras paulistas no chamado estudo do meio. Durante muito tempo, lecionou em escolas públicas do Estado e por suas mãos passaram alunos que depois se notabilizariam como ambientalistas de primeira grandeza, como Fábio Feldman, que foi Secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, e o biólogo João Paulo Capobianco, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente. A pedagoga orgulha-se também de ter criado, em 1975, e dirigido o primeiro parque ecológico paulista, em uma área anexa à Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). “Foi uma iniciativa pioneira, na qual me envolvi com questões proibidas durante o regime militar, como conservação de flora e fauna e educação ambiental”, relembra.
No início dos anos 1980, de volta a São Paulo, Nícia fundou, com um grupo de amigos, professores e outros profissionais da área ambiental, a ECO – Associação para Estudos do Meio Ambiente, uma das mais antigas ONGs brasileiras, especializada em educação ambiental. “Estávamos cientes da importância de desenvolver atividades de lazer e de conscientização baseadas em informações consistentes e no contato com ambientes naturais, utilizando-se de viagens educativas e estudos voltados ao público estudantil”, diz a educadora.
Essa concepção – de levar os jovens a campo, para conhecer a natureza de perto –, acredita Nícia, está na base do sucesso de qualquer iniciativa de educação ambiental. “É fundamental mostrar as coisas como elas são. Não adianta o professor dar uma aula maravilhosa no quadro-negro. É preciso levar o aluno à praça do bairro e mostrar a ele como a planta consegue os nutrientes do solo e os demais mecanismos da natureza”, diz a ambientalista, que atualmente está envolvida com um projeto de conservação de psitacídeos (grupo de aves que inclui as araras e os papagaios) no Parque Estadual de Jacupiranga, na região sul de São Paulo.
“Essa é uma das regiões mais preservadas do Estado, com uma grande mancha de Mata Atlântica. Mas, infelizmente, a caça ilegal está ameaçando de extinção o papagaio-de-peito-roxo”, diz Nícia. Uma das atividades realizadas no parque, sob coordenação da ECO, consiste em conscientizar a população sobre os prejuízos do comércio ilegal de animais silvestres. “Jovens da região estão atuando como auxiliares no trato das aves e nos trabalhos de conservação ambiental. O projeto prevê o envolvimento da comunidade local, incluindo a população escolar”, diz a incansável mestra.

Cidadania ambiental

No Rio de Janeiro, outra defensora da conscientização juvenil em relação ao ambiente é a professora de Geografia Regina Viegas, do Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET) Celso Suckow da Fonseca. Tanto que ela foi em busca de um diagnóstico mais preciso que permitisse um trabalho efetivo com os alunos. Preocupada com a visão que seus alunos tinham da problemática ambiental, ela associou-se ao pesquisador Roosevelt Fernandes, do Núcleo de Estudos em Percepção Ambiental da Faculdade Brasileira de Vitória, no Espírito Santo, e elaborou uma pesquisa intitulada Avaliação do Perfil de Cidadania Ambiental de Estudantes do Ensino Médio-Técnico do CEFET-RJ. “Trabalho com educação ambiental há 13 anos e verifico certa desmotivação dos jovens com relação ao assunto. Resolvi elaborar esse trabalho para avaliar em que estágio se encontra a cidadania ambiental desses jovens”, diz.
Foram aplicados questionários cobrindo quase a totalidade dos alunos concluintes do CEFET em 2005. Depois de tabulados, os resultados revelaram alguns dados preocupantes. Chamou a atenção da pesquisadora o fato de apenas 18% dos alunos afirmarem que os temas relativos ao ambiente vêm sendo tratados com freqüência nas escolas. Para piorar, 90% admitem que o assunto também não faz parte da pauta das discussões familiares. Outro indicador revelador do desinteresse e da desinformação dos alunos, em sua maioria pertencentes à classe média e oriundos de escolas de bom nível, é o elevado índice (75%) dos que não têm hábito de acessar sites ligados à questão ambiental. Ao mesmo tempo, 73% afirmaram não acreditar que iniciativas isoladas de um cidadão possam modificar a continuidade de uma ação prejudicial ao meio ambiente.
Segundo a educadora, os resultados do trabalho comprovaram o que muitos já sabiam: a inclusão efetiva da educação ambiental no currículo é urgente. “No mundo em que vivemos, é impossível que os jovens não conheçam os problemas ambientais e não saibam atuar sobre eles. Não é apenas uma questão de mercado de trabalho ou simples informação. Trata-se de uma questão de cidadania, de formação de valores e, até mesmo, de inclusão social”, defende. A partir da pesquisa, diz Regina, será possível mapear ações específicas complementares de educação ambiental que possam direcionar e ampliar a visão socioambiental dos jovens em relação ao seu dia-a-dia profissional e pessoal


Cuidados com a Amazônia

Assim como as colegas do Sudeste, a professora Luiza Pereira da Silva também está envolvida no seu dia-a-dia com o desafio de melhorar o ensino brasileiro e mostrar aos jovens a importância da preservação ambiental. Ela leciona na Escola Bosque Professor Eidorf Moreira, um centro de referência em educação ambiental localizado na ilha da Caratateua (também conhecida como Outeiro), a 22 quilômetros de Belém. No ano passado, ela foi uma das educadoras premiadas pelo Ministério da Educação pelo trabalho em favor do ensino médio. “Tudo começou no segundo semestre de 2005, quando passei a coordenar os cursos do ensino médio noturno e a educação de jovens e adultos da escola. Fizemos uma avaliação e detectamos um alto índice de evasão, superior a 50%”, diz Luiza.
A professora não se abateu com o que viu. Ao contrário, arregaçou as mangas e criou um programa, denominado Projeto Curupira, com o objetivo de trazer os alunos de volta à sala de aula. “Na avaliação, eles disseram que tinham de abandonar a escola para trabalhar. Com isso, dividimos o projeto em três eixos: formação profissional, organização curricular por projetos interdisciplinares e formação e resgate cultural”, diz a educadora. No fim de 2005, o Curupira foi escolhido pelo MEC como um dos dez projetos nacionais de destaque no incentivo de melhoria do ensino médio. “Ganhamos 140 mil reais para colocá-lo em prática. O trabalho foi iniciado no começo de 2006 e os resultados têm sido ótimos. A evasão escolar já caiu pela metade.”
Várias oficinas profissionalizantes e culturais foram implantadas, sendo que algumas têm o objetivo de gerar renda para os alunos. E a educação ambiental, onde entra? Simples: nas atividades, os alunos trabalham com recursos naturais da região, como na oficina de confecção de bijuterias, que usa sementes de frutos e plantas da Amazônia, como açaí, bacaba, jupati, caranã e tucumã, além de cascas de coco, bambu e madeira. O mesmo acontece com a oficina de confecção de instrumentos musicais, que deu origem a um grupo de percussão formado por 12 alunos, e de grafismo em cuias, que são utilizadas para servir o tacacá, comida típica do Pará.
“Na coleta de recursos da floresta, falamos da importância da preservação”, diz Luiza. “Além disso, a questão ambiental é trabalhada de modo transversal em todas as disciplinas dos cursos”. Um exemplo disso é o projeto voltado ao estudo do espaço urbano da ilha de Caratateua. “No tema ‘Posse e Propriedade’, discutimos com os alunos o processo de ocupação desordenada da ilha. Queremos que eles reflitam sobre as conseqüências das invasões para o meio ambiente, uma vez que provocam a destruição das florestas e causam impactos nos igarapés”, diz a pedagoga. O esforço tem valido a pena. “O trabalho tem ajudado no resgate da auto-estima dos jovens e deu uma oxigenada no ensino noturno do colégio.”
Matéria publicada Março 2007

Nenhum comentário:

Postar um comentário